terça-feira, 8 de maio de 2012

DANO MORAL E AUSÊNCIA DE AFETO

Nilton Tavares da Silva - Juiz de Direito da 5ª Vara de Família e Sucessões de Porto Alegre - ZERO HORA 08/05/2012

Jornal com circulação local, face recente decisão do Superior Tribunal de Justiça amplamente divulgada na mídia, estampou em manchete que “A partir de agora, pais que não derem carinho aos filhos serão condenados a pagar indenização a eles”.

Com a devida vênia, apressada e equivocada a afirmativa.

Por primeiro, imperioso que se ressalte que a referida decisão não tem efeito vinculativo como açodadamente noticiado. Vale dizer, a ela não está atrelado nenhum outro órgão julgador, não significando, portanto, que se terá substancial alteração do entendimento que de forma amplamente majoritária vem prevalecendo. Em segundo lugar, não é definitiva, aliás sequer tomada de forma unânime pelos julgadores, o que, em tese, viabiliza eventual reexame no próprio âmbito do STJ, onde até aqui, repita-se, vem prevalecendo entendimento em contrário ao argumento de que genitor omisso, “condenado a indenizar o filho por não lhe ter atendido às necessidades de afeto, não encontraria ambiente para reconstruir o relacionamento...”.

Penso que ao final e ao cabo é o entendimento que haverá de prevalecer. A melhor solução para as desavenças familiares é a conciliação e a mediação, evitando-se o litígio e suas nefastas consequências. Não existe previsão legal no ordenamento jurídico no sentido de impor aos pais a obrigação de amarem os filhos e vice-versa, até porque se trata de algo natural, não necessitando, por óbvio, de regras específicas para que ocorra. Mas mesmo quando esse basilar princípio de convivência familiar na prática não se concretize, ainda assim, insisto, não há razoabilidade para que a ausência de afeto reste compensada pela imposição de indenização pecuniária.

Nada pode substituir o abraço ou um beijo trocado entre pais e filhos. Mesmo quando essa saudável relação não se concretizar por injustificável omissão por parte de quem caberia a iniciativa, ainda assim, insisto, tenho que eventual compensação monetária não teria nem ao menos caráter pedagógico/compensatório, servindo, ao contrário, isto sim, para inviabilizar em definitivo a almejada convivência afetiva. E justamente entre pessoas tão próximas, pais e filhos, que haveriam de nortear a relação através do amor incondicional e mútua compreen- são. Acaso a opção seja pela compensação financeira, acredito que nenhuma esperança restará para que um dia o convívio venha a ser pautado pelo afeto.

Como há mais de duas décadas escreveu Fernando Mottola em memorável sentença que por sua invulgar beleza entrou para os anais da história forense do Estado, “se for inevitável que a ternura almejada se converta em amargo fel, que o carinho tenha por recompensa a incompreensão, que isso se faça pela mão de outrem...”.

A quem decide, com a devida vênia dos que pensam em contrário, não cabe contribuir para que o “amargo fel” prevaleça e se perpetue.

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